Sexo: liberdade e controle do corpo
- victoriasolare0
- 26 de jun. de 2024
- 8 min de leitura
Atualizado: 8 de ago. de 2024
Esse é um assunto polêmico.
O sexo é potência; quando praticado com respeito, confiança e tesão, transborda energia vital e criativa. Por outro lado, a força do sexo também pode ser destrutiva, quando o ato é imprudente e desonesto; drena a energia de vida e gera desconforto.
AG: Esse post discute violência sexual e é escrito a partir de um ponto de vista heteronormativo.
E que prazer é dar e receber, libertar-se na cama e no mundo ao lado de quem te respeita e te deseja o bem. Sexo livre e selvagem pode ser delicioso, mas nada supera o prazer de fazer amor – esse, sim, é raridade.
Pessoalmente, já me iludi com a sensação de liberdade e também já me aprisionei sexualmente. Em ambas as fases, fui guiada (em parte) pelo meu próprio julgamento e preconceito. A liberdade sexual de uma mulher incomoda muita gente; a mulher que conhece, desfruta e controla o poder do seu corpo é uma ameaça tanto para o status quo quanto para outras mulheres.

Acredito que a mulher permissiva poderia se beneficiar ao aprender a importância do "não", uma vez que, na tentativa de satisfazer os homens, é possível que silenciem seus próprios desejos. Por outro lado, sinto que outras mulheres poderiam descobrir o poder de um bom e sonoro "sim". Privar-se de sexo e prazer na tentativa de conquistar ou punir um homem me parece um desperdício de felicidade – quase uma autopunição. Tanto a mulher conservadora quanto a permissiva poderiam gozar mais entendendo que sua sexualidade lhes pertence – não é deles nem para eles; o sexo é nosso, para ser uma fonte de felicidade, criação, rejuvenescimento e brilho. O sexo é para todos (mas nem todos são para o sexo).
Na contemporaneidade, a mulher goza de uma relativa liberdade sexual, especialmente quando comparada a outras épocas da história; já os homens sempre foram mais livres. Desde os primórdios das relações humanas, quando o est#pro era um ato banal, até a era vitoriana (marcada por repressão sexual e conservadorismo), o homem sempre pôde comprar sexo (e violent#r) na intimidade. Já que a mulher violad# era condenada e culpabilizada – esse tipo de mentalidade e legislação ainda resiste em algumas culturas. Inclusive no Brasil (de meneira velada), estima-se que apenas 10% a 15% dos casos de est#pro sejam denunciados, isso parece ser consequência de um sistema que constrange a mulher fragilizada ao submetê-la a um processo de denúncia, no mínimo, desagradável, e de uma cultura machista que despeja desgosto sobre a vítima.
O sexo de fácil acesso pode ser usado como mais uma ferramenta de controle do homem sobre o corpo e a sexualidade feminina, perpetuando um ciclo de submissão. A desenfreada "liberdade sexual" pode ser nociva, onde (ainda que inconscientemente) a mulher corresponde às expectativas masculinas às custas das próprias.
Como mencionado anteriormente, o poder sexual feminino é uma ameaça ao status quo - o controle do corpo da mulher também está relacionado à criação da propriedade privada. O marido, com o intuito de proteger suas propriedades e diminuir o risco de criar um herdeiro "ilegítimo", decidiu fazer do sexo da esposa parte de suas posses: sexo dominado e domado, enquanto o homem permanecia livre para penetrar meretrizes e mulheres em desvantagem socioeconômica. É interessante parar para pensar no triângulo: propriedade privada, controle sexual e a Igreja Católica. O controle da sexualidade dos líderes religiosos foi estabelecido pela instituição para a preservação de suas propriedades, que não deveriam ser usufruídas pelas esposas dos membros da igreja ou diluídas através de heranças – era mais fácil estabelecer a castidade dos membros do clero do que lidar com as questões burocráticas e financeiras do casamento.
É preciso esquecer do julgamento, da cultura, da propaganda e das expectativas para encontrar prazer genuíno. O sexo performático pode ser intenso, mas o verdadeiro êxtase é vivido quando esquecemos de tudo e permitimos que o corpo controle nossos movimentos enquanto a mente se esvazia, deixando para trás a culpa católica, a pressão estética e a condenação alheia; o que interessa é a presença, é estar ali por inteiro, é tornar dois em um, é ser um por completo, é transformar dois corpos em um universo. Gozar não é obrigatório, mas quando rola é explosão; pode ser silencioso ou pode acordar a cidade inteira, chacoalhar as estruturas suas, do outro e de onde você estiver.

Hoje, me sinto livre; com respeito ao meu corpo e desejos. Sou caçadora, não presa; escolho e não me permito ser escolhida. Seduzo aquele que valorizo; não caio na tentação de ser seduzida por quem se interessa apenas pelo que meu corpo e energia podem oferecer. Sem nenhum tipo de moralismo, mas protegendo meus valores de lealdade e respeito, só bebe da minha fonte de amor aquele também me nutre e preenche, jamais aquele que me consome e esvazia.
Recomendo a você, mulher, que se liberte, seja com seu marido ou com aquele que te interessa. Minha dica é: escute seu corpo. Do ponto de vista psicanalítico e biológico, respectivamente, nosso subconsciente armazena tudo o que vimos, ouvimos, pensamos, experienciamos e sonhamos – informações que escapam à nossa consciência, enquanto nossas células e nosso código genético carregam mais informações do que somos capazes de mensurar; e espiritualmente, acredita-se que carregamos sabedoria ancestral, o que justificaria aquilo que cada indivíduo domina sem compreender de onde vem. Por isso, nosso corpo e nossa intuição possuem um conhecimento que supera a da nossa mente. Ao compartilhar tempo com um predador, podemos sentir desconforto, ansiedade, uma mistura de sentimentos que pode ser confundida com excitação. Já o parceiro “ideal” nos faz bem, independentemente de quem é, do que faz ou do que tem.
Caso você se veja presa a padrões antigos de relacionamentos afetivos e íntimos destrutivos, converse com pessoas que você considera bem-sucedidas no amor, pessoas que te querem bem, compartilhe suas experiências e sentimentos; eles podem te ajudar a encontrar clareza através de outras perspectivas. Pode demorar para que um homem confiável se aproxime; meu conselho é: torne-se uma companheira admirável e você atrairá homens que estão a sua altura. No meio tempo, goze com você, se conheça e descubra do que gosta; isso facilitará ensinar ao parceiro como te satisfazer.
Gosto da analogia de que, no sexo, o homem é uma pistola e a mulher é uma metralhadora; para quem reproduz o BE-A-BA, para quem é educado na pornografia, falocentrista, abrupta e mecânica, eu indico: jejum porn#gráfico! Preserve sua energia até se sentir pronto pra gozar com a mente; o sexo fica muito mais gostoso. E pra quem deseja ir além, recomendo estudar o sexo tântrico: sensorial e duradouro; homens e mulheres exacerbam sua potência; o masculino se liberta do que sempre conheceu e que o limita podendo chegar ao orgasmo sem ejacular e ainda existe a possibilidade de conhecer aquilo que mais inveja na mulher: orgasmos múltiplos: e a mulher, bom... Eu recomendo que experimente, mudou a minha vida e me mostrou do que o meu corpo é capaz.
Agora, falando de um ponto de vista capitalista… Não é coincidência que as profissões onde as mulheres ganham mais do que os homens sejam aquelas em que o corpo feminino é o principal produto (como na pr#stituição, como modelo e influêncer digital). Estima-se que apenas 2% a 20% das terras mundiais são de propriedade feminina. Ainda estamos inseridos, majoritariamente, em uma estrutura onde homens são apreciados pelo sucesso financeiro e mulheres pela sua aparência e juventude. “Uma mulher jovem pode, na realidade, se sair melhor, do ponto de vista econômico, investindo em sua sexualidade enquanto ela tem o valor máximo, do que trabalhando sério por uma vida inteira.” ¹. Embora vivamos em uma sociedade criada por homens para homens, no campo sexual, é a mulher quem detém o controle. Somos nós que decidimos quando, onde e com quem. Independentemente do poder que o homem exerce no trabalho, na cama, é ela quem manda; sobretudo no começo do relacionamento a palavra final é da mulher. Quem viveu sabe o que um homem é capaz de fazer para transar pela primeira vez haha.
Não recomendo usar o sexo como uma arma ou ferramenta de manipulação. Em relacionamentos saudáveis, homens e mulheres são parceiros, não rivais. Quando o sexo se traduz em recompensa ou punição, o desejo e o prazer se pervertem; o sexo deve existir para o casal se conectar, se revitalizar e aliviar o estresse. Praticá-lo com outros propósitos não leva à satisfação genuína. Mas… De acordo com a minha visão, quando uma mulher renuncia seus privilégios de gênero enquanto exime o homem de suas responsabilidades em nome da igualdade, a desvantagem de gênero se potencializa; a mulher continua em desvantagem no capitalismo (como sempre esteve), segue encarregada da maior parte das tarefas domésticas e da criação dos filhos, enquanto investe tempo e dinheiro para se manter atraente: ela encara uma jornada de trabalho tripla! Enquanto o homem a penetra com um sorriso no rosto e nem sequer se esforça para fazê-la gozar. Por isso, sugiro às minhas leitoras que transem com homens que as respeitem, as protejam, valorizem e empoderem, e deixem que os egoístas se resolvam na mãozinha.
A mulher que domina seu poder sexual é protagonista do próprio prazer e majestade do seu próprio corpo, navega a vida ao ritmo de seus desejos.
Como a liberdade sexual das mulheres pode influenciar suas dinâmicas? A competitividade feminina é biológica e cultural; aquela que é sexualmente "escassa" pode ressentir a mulher sexualmente potente. De um ponto de vista fisiológico, isso é natural, já que, como animais, nosso objetivo é a reprodução da espécie. De um ponto de vista cultural, histórico e sistêmico, é impossível discorrer sobre essas camadas sem fugir do tema central do post, já que é um assunto bastante complexo. A competitividade feminina toca em questões etárias, étnicas e de classe social. Para ser simplista sobre esse assunto - a mulher sexualmente reservada pode desprezar ou excluir a mulher sexualmente livre, seja pelo medo de perder o parceiro, pelo desejo de ter um, ou pela frustração de não desfrutar do prazer do próprio corpo. No passado, a competição feminina e a crítica me aborreciam, mas compreendi que todo julgamento é uma confissão e que a dor do outro não pertence a mim.
Tarefa de casa: todos gozando, sozinhos, a dois ou em grupo, porque afinal de contas, gente feliz não enche o saco.
PS.: A mulher que tem um satisfyer e um dildo não precisa de homem nenhum para gozar a vida.
Comentário da escritora:
* Os dois primeiros livros citados foram muito importantes para a minha consciência em relação às questões de gênero e dos desejos que acreditava serem meus, mas que por vezes são imposições culturais. Porém, parei de consumir esse tipo de literatura, porque, no presente, não me faz bem o estabelecimento de um modo de pensar determinista. Me peguei replicando as condutas que abomino no sexo oposto e, por mais que eu honre a raiva do oprimido, também a entendo como contraproducente dentro do sistema em que vivemos. Busco amar os homens da minha vida, quero-os como aliados, e não adversários, minha luta não é mais por igualdade e sim por equidade.
Referências bibliográficas:
1. Wolf, Naomi. O Mito da Beleza. 1991.¹
2. Lerner, Gerda. Criação do Patriarcado: História da Opressão das Mulheres Pelos Homens. 1986.
3. Estés, Clarissa Pinkola. Mulheres que Correm com os Lobos. 1992.
4. Harari, Yuval Noah. Sapiens: Uma Breve História da Humanidade. 2014.
5. Deida, David. O Caminho do Homem Superior. 2004.
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Victoria Solare
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